Em um mercado altamente competitivo, as oportunidades de reposicionamento do ponto de venda se fazem cada vez mais necessárias.
Num mercado extremamente competitivo como o varejo farmacêutico, mudanças rápidas de estratégia e atualização do modelo de negócio são fundamentais para se manter vivo entre os concorrentes. Seja numa grande capital ou numa cidade do interior, acompanhar as mudanças sociais e econômicas regionais é um trunfo essencial para garantir os lucros e o sucesso do negócio.
Mudanças de endereço, layout, público-alvo, MIX de produtos, entre outros, são apenas algumas formas de o varejista renovar e modernizar o ponto de venda, a fim de se adequar aos novos tempos e às transformações do setor. Chamado de “reposicionamento de mercado” pelos especialistas, a palavra nada mais é do que a modernização da loja e a readequação às mudanças impostas pelo crescimento econômico, sociais e de concorrência.
Nos últimos anos, o ritmo de crescimento de novas farmácias no Brasil foi de cerca de 30% a cada período de cinco anos, segundo o Conselho Federal de Farmácia (CFF). No total, o País tem cerca de 65 mil pontos de venda espalhados pelos cerca de 5.500 municípios. Com o crescimento da economia, esse número tende também a crescer, principalmente nas áreas onde o crescimento regional está acima da média do País. Até 2015, a Federação Brasileira das Redes Associativistas de Farmácias (Febrafar) acredita que esse número chegue a 72 mil pontos de venda.
Conforme o Guia da Farmácia publicou em edições anteriores, o avanço dessas áreas despertou o interesse das grandes bandeiras, que já estão de olho nas cidades de até 50 mil habitantes. Com isso, a concorrência deve se acirrar ainda mais no País inteiro, exigindo mais proatividade do varejista para promover mudanças e readequar seu negócio.
O diretor da Desenvolva Consultoria e Treinamento, Marcelo Cristian, afirma que o acompanhamento detalhado da vida financeira e comercial da loja dá sinais sobre as mudanças que precisam ser feitas. Segundo ele, mensurar os números é o ponto primordial para entender as transformações necessárias: “A mudança, dependendo do nível, altera a rentabilidade, a imagem da empresa para o cliente e o público que frequenta a loja”, avalia. “Quando tratamos de gerenciamento por categorias, por exemplo, mensuramos cada espaço com precisão, baseado em indicadores. No momento em que um desses indicadores apresenta queda ou estabilidade, é sinal de que é necessário mudar. Esses indicadores podem ser a venda de alguma categoria, o faturamento, a quantidade de unidades vendidas, por exemplo”, explica o consultor.
Na opinião da consultora Silvia Osso, o reposicionamento deve ser considerado também no momento em que as farmácias estão com sua imagem ruim desde a arquitetura externa até a interna. Muitos anos sem mexer na fachada, layout ultrapassado, piso desgastado, iluminação e, principalmente, estoque com rupturas e capital humano, são alguns dos motivos que levam a maioria dos empresários do setor a promover reformas, diz a consultora. É preciso mudar de atitude e o conceito do ponto comercial. O passado já foi, mas às vezes o farmacista não encara que a realidade é dura. Agilidade é um ponto importante e investimento em reformas, equipamentos, estoques e pessoas é fundamental”, avalia Silvia.
Além dos aspectos físicos e econômicos internos, os consultores ouvidos pela revista apontam que a chegada de novos concorrentes, a mudança do perfil socioeconômico e cultural de um determinado bairro e até a instalação de obras públicas como metrô, hospitais, unidades públicas administrativas, etc. podem levar à necessidade de mudanças na loja.
No caso de abertura de uma nova loja, por exemplo, o varejista deve entender o ponto de venda na hora de optar pela mudança no mix de produtos. Em bairros com poder aquisitivo mais modesto, produtos de valor agregado maior não registram grande saída, assim como nos bairros mais abastados, a cesta de itens básicos e mais populares costuma ter giro menor. Segundo os especialistas, esse perfil de cliente pode mudar com o passar dos anos, especialmente no momento que o País vive, onde cerca de 63 milhões de brasileiros ascenderam socialmente na última década. “O posicionamento precisa seguir minimamente o modelo dos grupos mais conceituados de farmácias e drogarias no País, desde que preserve a sua natureza original. Não há mais espaço para farmacistas que não se atualizam e vivem nos moldes antigos de farmácias”, sentencia Silvia.
Ousadia, visão de futuro e coragem de mudar também são atributos essenciais para promover o reposicionamento da loja, de acordo com os especialistas consultados. E esses atributos não faltaram ao empresário Giuliano Trindade. Dono de uma rede de sete farmácias na cidade de Campo Belo, em Minas Gerais, ele deu uma guinada nos negócios e resolveu transformar uma das lojas em modelo popular com foco nas classes C e D, através da bandeira Ultrapopular. Nesse modelo, as lojas da rede são menores que as normais e só trabalham com produtos e marcas de curva A, que indicam alta rotatividade. A unidade não oferece serviços de atenção farmacêutica e tem um mix de produtos de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (HPC) também muito menor que as outras lojas.
O diferencial do modelo Ultrapopular é exatamente o preço reduzido, com foco em genéricos e similares, pagamento no cartão de crédito ou no cheque, com direito a parcelamento. Ao contrário do modelo das demais lojas, Trindade consegue oferecer os medicamentos genéricos com até 30% de desconto, graças ao modelo de negociações coletivas da rede, e os similares com no mínimo 55% de desconto no preço de tabela. “Foi uma decisão arriscada, porque a própria entrada desse novo modelo poderia prejudicar as minhas outras lojas. Mas sempre pensei que não dava para manter o negócio do mesmo jeito, sem modernizar e sem proporcionar algo novo para fazer frente às grandes bandeiras, que estão o tempo todo nos ameaçando”, conta.
O medo e a ousadia do empresário em pouco tempo se transformaram em case de sucesso e motivo de curiosidade. Em apenas três meses o faturamento da loja subiu de R$ 40 mil por mês para cerca de R$ 300 mil. “Já no primeiro mês a gente sentiu uma diferença significativa de 30%. Como não fiz muita propaganda na cidade para justamente não prejudicar minhas outras lojas, o boca a boca foi crescendo e hoje superamos todas as expectativas”, comemora o empresário.
No modelo Ultrapopular adotado por Giuliano Trindade, a loja tem cerca de 80 metros quadrados, praticamente metade do tamanho das outras, que têm cerca de 150 metros. A administração também contempla a redução total de custos e a loja tem apenas seis dos doze empregados habituais das outras lojas. Não há serviço de entrega, aferição de pressão nem aplicação de injetáveis. “O atrativo é essencialmente o preço e agilidade na dispensação. A linha de produtos de HPC só tem itens de primeira necessidade e com presença maciça de mídia. E os consumidores não têm reclamado”, explica.
O sucesso em Campo Belo foi tão grande que o empresário mineiro já planeja a abertura de duas outras lojas do mesmo modelo em outras cidades próximas. “Com apenas 53 mil habitantes, acho que Campo Belo não comporta duas lojas iguais. Como as demais unidades da minha rede não foram afetadas, nossa estratégia de crescimento vai ser para outros municípios”, considera.
O sucesso do empresário mineiro atraiu diversos outros empresários do ramo e mensalmente ele recebe outros varejistas interessados em adotar o modelo em suas cidades. “Vem gente de todos os lugares do Brasil. Esperamos que o boca a boca e a satisfação dos clientes possam nos ajudar ainda mais. Em 15 anos de mercado, não pensei que viveria um momento tão otimista como agora. Nada como dar um passo correto e sem medo”, desabafa.
Até o ano de 2017, as projeções do mercado indicam que o setor de varejo farmacêutico deverá dobrar de tamanho, atingindo R$ 87 bilhões em volume de vendas. Na opinião dos especialistas esse crescimento deve atrair novos players ao mercado, deve acomodar bandeiras estrangeiras e, principalmente, atrair novos empreendedores do setor que sonham com o negócio próprio. “É um momento único vivido pelo Brasil. Ninguém sabe quanto tempo vai durar, uma década, duas. Fato é que o pequeno e médio empresário precisa investir e ter planejamento estratégico se quiser surfar nesse período positivo. O momento de mudar é agora e é preciso ter sensibilidade e acompanhamento para isso”, diz o consultor Cadri Awad.
Na opinião de Silvia, o reposicionamento inclui mudanças de vários aspectos, como arquitetura interna e externa, estoque, gestão de categorias, informatização, gestão de pessoas, estratégias de marketing, dentre outros. “O que não pode é parar no tempo. É quase necessário se reinventar o tempo todo”, diz ela.
Cadri Awad compartilha a opinião e diz que as oportunidades estão postas e os varejistas precisam desenvolver a estratégia mais singular para o seu negócio, acompanhando detalhadamente as contas da empresa e a evolução dos números, com dedicação e profissionalismo. “Não se pode perder o bonde da história”, sentencia ele.
Fonte: Guia da Farmácia - outubro 2012